FONTE: Artigo "Ele foi um Grande Homem" (Por Otávio Luiz Machado), JC, 26 out. 2010, p. 11
Artigo "Ele foi um Grande Homem" [ou uma Pequena Homenagem ao Biu do CFCH]"
Como diz o ditado, a gente só dá valor de verdade quando perdemos. Acredito que isso se aplica para o caso do funcionário Severino Ramos, o Biu. Alguns dizem que se dedicou mais de trinta anos ao CFCH da UFPE. O que sabemos é que sua presença era marcante no cotidiano da Universidade, cujo vazio deixado nos faz pensar sobre muitas coisas.O acidente que culminou com sua morte ocorreu quando justamente ia buscar os pães para os seus companheiros de trabalho. Não voltou mais! Não foi só com fome pela falta do alimento que todos ficaram, mas com uma grande fome de justiça.
O local do acidente é pessimamente sinalizado, o que medidas básicas poderiam evitar o pior. Também recebeu um tratamento desumano no Hospital da Restauração, pois ficou ali sozinho e jogado com a mesma roupa e botas. Suas roupas e seu rosto de trabalhador trazem a marca da invisibilidade, o que gera enorme desrespeito a um cidadão que todos por aqui conheciam pelo seu alto valor como pessoa e profissional. No sistema público de saúde era mais um.
Nem na hora próxima do seu sepultamento no Cemitério da Várzea as coisas andaram bem. Um dos homens que estava sendo velado junto a Biu recebeu a visita do filho preso, que foi escoltado por policiais munidos de metralhadoras e pistolas no meio da multidão. Em caso de emergência certamente as metralhadoras seriam acionadas não importando a quem os tiros iriam atingir, porque aqueles homens não estavam ali para proteger ninguém.
Que sua mãe no alto dos 93 anos ainda tenha em vida a justiça de seu filho injustiçado. Injustiçado pela desigualdade social que insiste em permanecer no Brasil, injustiçado pela falta de acesso a um sistema de saúde decente e injustiçado no seu velório com a presença de homens que não respeitaram a presença dos seus amigos na última despedida.
Que as nossas contradições diárias sejam repensadas, porque tratar pessoas humildes como cidadãos de última categoria e humilhá-las na frente das outras pessoas não cola mais a cada dia que se passa. Alguns dos nossos melhores doutores que estudaram na Europa, nos Estados Unidos ou mesmo no Brasil com bolsas de estudos e ajudas mil pagas pelo suor de tantos como Biu, certamente ainda se sentem muito incomodados ao subir no mesmo elevador ou a conviver diariamente com funcionários que prestam valiosos trabalhos, mas que nem sempre são valorizados.
Que Biu descanse em paz! Mas que sua experiência não nos deixe nunca mais acomodados com a desigualdade que nos cerca, com a opressão que nos desafia e o silêncio que contribui para a morte de muitos todos os dias.P.S. Uma homenagem na instituição seria algo muito justo com a família de Biu e os seus companheiros de trabalho que permanecem entre nós. A criação de uma Ouvidoria na UFPE para receber denúncias relacionadas à preconceitos e a humilhações seria uma boa iniciativa.
Como diz o ditado, a gente só dá valor de verdade quando perdemos. Acredito que isso se aplica para o caso do funcionário Severino Ramos, o Biu. Alguns dizem que se dedicou mais de trinta anos ao CFCH da UFPE. O que sabemos é que sua presença era marcante no cotidiano da Universidade, cujo vazio deixado nos faz pensar sobre muitas coisas.O acidente que culminou com sua morte ocorreu quando justamente ia buscar os pães para os seus companheiros de trabalho. Não voltou mais! Não foi só com fome pela falta do alimento que todos ficaram, mas com uma grande fome de justiça.
O local do acidente é pessimamente sinalizado, o que medidas básicas poderiam evitar o pior. Também recebeu um tratamento desumano no Hospital da Restauração, pois ficou ali sozinho e jogado com a mesma roupa e botas. Suas roupas e seu rosto de trabalhador trazem a marca da invisibilidade, o que gera enorme desrespeito a um cidadão que todos por aqui conheciam pelo seu alto valor como pessoa e profissional. No sistema público de saúde era mais um.
Nem na hora próxima do seu sepultamento no Cemitério da Várzea as coisas andaram bem. Um dos homens que estava sendo velado junto a Biu recebeu a visita do filho preso, que foi escoltado por policiais munidos de metralhadoras e pistolas no meio da multidão. Em caso de emergência certamente as metralhadoras seriam acionadas não importando a quem os tiros iriam atingir, porque aqueles homens não estavam ali para proteger ninguém.
Que sua mãe no alto dos 93 anos ainda tenha em vida a justiça de seu filho injustiçado. Injustiçado pela desigualdade social que insiste em permanecer no Brasil, injustiçado pela falta de acesso a um sistema de saúde decente e injustiçado no seu velório com a presença de homens que não respeitaram a presença dos seus amigos na última despedida.
Que as nossas contradições diárias sejam repensadas, porque tratar pessoas humildes como cidadãos de última categoria e humilhá-las na frente das outras pessoas não cola mais a cada dia que se passa. Alguns dos nossos melhores doutores que estudaram na Europa, nos Estados Unidos ou mesmo no Brasil com bolsas de estudos e ajudas mil pagas pelo suor de tantos como Biu, certamente ainda se sentem muito incomodados ao subir no mesmo elevador ou a conviver diariamente com funcionários que prestam valiosos trabalhos, mas que nem sempre são valorizados.
Que Biu descanse em paz! Mas que sua experiência não nos deixe nunca mais acomodados com a desigualdade que nos cerca, com a opressão que nos desafia e o silêncio que contribui para a morte de muitos todos os dias.P.S. Uma homenagem na instituição seria algo muito justo com a família de Biu e os seus companheiros de trabalho que permanecem entre nós. A criação de uma Ouvidoria na UFPE para receber denúncias relacionadas à preconceitos e a humilhações seria uma boa iniciativa.
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