OPINIÃO: Cidadania, respeito, dignidade e política (Por Por Mariana Ferraz, Estudante de Jornalismo da UFPE)
Na cadeira de Telecinejornalismo, teremos que fazer (a turma) uma série de reportagens. Temos que escolher um tema geral e cada um dos seis grupos abordará um subtema. No início, a sugestão que surgiu era “isso é a cara de Pernambuco”. Eu amo esse estado, mas achei uma opção muito ufanista. Agora, contraditoriamente – na minha opinião – veio em sala de aula uma nova ideia: “Recife: a cidade que se autodestrói”. Por muitas razões, esse mote me incomodou. Incomodou tanto, mas tanto, que decidi escrever este artigo, explicitando o porquê.
Em primeiro lugar, pela própria mudança drástica no pensamento. Afinal, a proposta é falar bem ou mal? Falar de problemas culturais ou da cultura popular que nos orgulha? É verdade que todos os lugares têm essas duas facetas. No entanto, fiquei confusa com esse comportamento ter se alterado tão rapidamente. Mas isso é apenas a questão mais superficial.
Em segundo plano, porque a partir do momento em que comecei a defender o outro tema – “Comportamentos do século XXI” (como relações sociais, velocidade, cybercultura, etc.) - muitos RIRAM de mim. Não compreendi. O que estava eu falando ali tão engraçado? Toda vez que eu pronunciava “relações sociais”, alguns alunos se calavam e, depois, caíam na risada. Também acho que minha voz é enrolada, às vezes engraçada mesmo, mas era um tema sério – o produto no qual trabalharemos até o final do semestre – então, para mim, essa atitude não se justifica. Senti-me altamente desrespeitada e magoada, pois alguns dos que vi rindo eram pessoas que eu considerava meus amigos.
Terceiro – e principalmente: Recife se autodestrói? Eu concordo que o poder público poderia ser mais atuante e não se preocupar apenas com os pontos turísticos, levando lazer e qualidade de vida às periferias. Concordo que muitas ruas estão sujas, muitas vezes fétidas; que esgotos correm por muitas vias, causando doenças. Mas é realmente a população, por si só, que faz isso?
Acho muito fácil dizer que o pobre faz xixi na rua porque não tem educação. Mas, se houvessem mais banheiros públicos, e se fossem limpos e com todo o material de higiene necessário (sim, em muitos falta papel higiênico e sabão para lavar as mãos), será que os casos não diminuiria drasticamente? Não vou afirmar, é claro, que iria zerar. Afinal, somos humanos, e sempre haverá algum que não se importará em fazer necessidades em locais inapropriados, pois também não se importam com os vizinhos e outras pessoas que passam por ali. Mas será que as ruas não iriam feder menos?
Se a coleta de lixo fosse mais eficiente e chegasse mesmo aos locais mais remotos da cidade, será que os pobres iriam morar perto do lixo? Não. Isso eu tenho certeza. Pobre não gosta de lixo. Ninguém gosta. Todos queremos dignidade, um espaço organizado, um teto pra nos abrigar e uma cama para dormir, em um bairro fresquinho e com grama verde. Esse sonho americano, no entanto, é disponível para poucos – aqueles mais beneficiados economicamente.
Em 28 de fevereiro deste ano, fui à Comunidade Arco Íris cobrir um incêndio de sete barracos. Os moradores, que já não tinham muita coisa, perderam tudo. Uma garota de 19 anos, que já era mãe inclusive, me impressionou bastante. Flávia Cabral, no início, falou pouco sobre o incêndio. Mas – orgulho-me em dizer – senti que ali tinha mais história, mais fatos a serem revelados. Com um pouco mais de insistência, ela me contou que fora ela quem encontrou os bombeiros, pois o fogo começou às 7h e, apesar das ligações dos moradores, acharam que era trote e não prestaram socorro imediato. Ela pedalou bastante até encontrar uma viatura e guiou eles até a comunidade.
Mas a melhor parte da apuração foi enxergar a revolta. A revolta dos moradores de viver ali, num lugar com péssimo cheiro e casas de madeira que ajudam qualquer faísca a se espalhar rapidamente. Embaixo da ponte de Peixinhos, um grande monte de lixo se acumula, pois os caminhões não recolhem os detritos daquelas casas. “Já jogaram até animal morto aqui”, conta Flávia. Cachorros. Gatos. “Até um cavalo já apareceu”, lamenta ela.
“Não chega água nem gás aqui”, completou Jaciara Josefa de Sousa, 51 anos, dona de casa. O pai dela, senhor Severino Venâncio, tem 103 anos e, quando precisa de médico, eles precisam andar muito até pegar um ônibus e encontrar uma policlínica. Agentes da saúde? “Também não vêm, ninguém chega aqui não, tá tudo só enganando a gente, só vem nas eleições pedir voto”, reclama Jaciara.
E então chegamos ao ponto principal: política. Eu amo política, mas não gosto da maioria dos políticos. Pois política e políticos são coisas diferentes. Política, com P maiúsculo, para mim, é democracia – o poder vem do povo e deve, sim, voltar ao povo. Talvez isso seja tão utópico quanto o socialismo marxista – mas, para mim, ainda é um sistema verdadeiro, embora ainda não o ideal.
Política, com P maiúsculo, é governar pensando não nas próximas eleições, mas nas próximas gerações – um estadista. Pensar nas próximas gerações é dar ao povo condições de vida dignas e chances de trabalho, de renda, de felicidade – sim, eu acredito na “PEC da Felicidade” do senador Cristóvam Buarque. É ensinar a pescar, e não dar o peixe – não é assistencialismo.
Infelizmente, porém, vivemos em um país em que a classe média cresce, o crédito cresce – que ótimo! -, mas ainda há muitos miseráveis passando fome na rua. Muitas crianças sem perspectiva de futuro na favela, que acabam indo para o tráfico, pois – numa inversão de papéis – a polícia é vista como ameaça e o traficante, como herói. Jovens mortos antes de completar sequer a maioridade. Sem imaginar uma profissão, uma família, um lar.
A escola não costuma chegar a essas crianças. Quando chega, é vista como algo atrasado, uma obrigação chata. Por que perder horas numa sala de aula, com fome, quando posso “trabalhar” para pôr comida na mesa e comprar tênis novos? Para que conquistar o professor, se o dono da boca é mais rico e influente? O que farei com esse conhecimento se, ao chegar no mercado de trabalho, sou discriminado porque moro na favela?
A educação poderia transformar, sim, esta realidade. Não sei se é tarde demais, como disse o traficante Marcola, do Primeiro Comando da Capital (PCC), atualmente preso, em entrevista: “Estamos todos no centro do insolúvel. Só que nós vivemos dele e vocês... Não tem saída”. Mas acredito fortemente nesta mudança. E por onde começar? (Aí concordo com Marcola) “Peguem os barões do pó! Tem deputado, senador, tem generais, tem até ex-presidentes do Paraguai nas paradas de cocaína e armas”, argumenta ele.
Esses mandatários corruptos que estão no poder – muitos há anos, “herdando” cargos da família – e que vão às comunidades pedir votos, depois esquecendo de todos: eles quem devemos punir, primeiramente. São eles quem dão ordens, quem articulam muitas leis que beneficiam a si próprios e seus comparsas e atrasam outras leis que a sociedade tanto almeja para se proteger e melhorar sua vida. São muitos deles que consomem, inclusive, as substâncias tóxicas mais puras, refinadas e caras, em orgias com dezenas de mulheres. O crack, por exemplo, é feito da mesma base da cocaína, mas é o resto, é a “parte ruim” misturadas com outros produtos que intensificam o efeito e aumentam a probabilidade do vício na primeira tragada. Esse é para as favelas, os becos, as vielas.
Os grandes chefes do tráfico estão sentados em uma cadeira que vale muito mais que seu salário ANUAL, gozando de benefícios mil e distribuindo cargos a muitos familiares e coleguinhas. É contra eles que precisamos lutar. URGENTE. Sua arma – com certeza já falei isso em outro texto, mas nunca é demais lembrar – é única e preciosa: O VOTO. Conheça seu candidato e todos os outros. Investigue. Cobre. É seu direito. É a sua chance.
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