Dados:
Atividade atual do depoente: Membro do Conselho de Administração da AMBEV e Presidente da Fundação Antônio e Helena Zerrenner (da AMBEV)
Entrevista feita em São Paulo-SP
Eu me chamo Roberto Herbster Gusmão, nasci em Belo Horizonte, no dia 29 de maio de 1923, casado com Ivna Tarsis D’Affonseca Gusmão, advogado — OAB nº 6.559/SP.
Como pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco, Otavio Luiz Machado, veio de Recife a São Paulo, armado com um gravador, especialmente para provocar minha memória e minhas lembranças sobre o comportamento de minha geração, diante dos fatos e acontecimentos marcantes daquela época. Partindo da nossa formação política, acadêmica e ideológica, fomos todos influenciados e marcados pela absurda e maciça propaganda do comunismo stalinista e do totalitarismo nazista e fascista, como ideologias salvadoras do mundo.
Desse modo, fomos vítimas e atores participantes dessas circunstâncias que colocaram mais dúvidas do que certezas nos nossos sonhos e nos nossos propósitos de jovens universitários.
Fiz parte daquele grupo que não se deixou levar por essas antagônicas e radicais ideologias, graças a nossa formação acadêmica e cultural com raízes profundas nos fundamentos da democracia e da justiça social.
A Segunda Guerra Mundial, apesar de suas atrocidades, trouxe também a derrocada das ditaduras e o fortalecimento em todo o mundo das democracias ocidentais.
Desse modo, foi elaborada e promulgada a Constituição de 1946, dando nova forma ao regime democrático brasileiro com amplas liberdades individuais e a legalidade de todos os partidos políticos com as suas diferentes ideologias.
A União Nacional dos Estudantes — UNE participou ativamente desse processo de redemocratização do País.
No memorável Congresso de 1947, que teve como presidente de honra o Governador de Minas Gerais, Dr. Milton Campos, fui eleito Presidente da UNE com uma ampla aliança com os representantes dos mais importantes diretórios acadêmicos de todos os Estados do Brasil.
O meu compromisso como Presidente da UNE era defender as liberdades individuais, particularmente a dos estudantes em sua vida acadêmica, sem nenhuma discriminação de raça, religião ou de ideologias.
A “Campanha Do Petróleo É Nosso” surgiu para não somente defender a exploração estatal do petróleo, mas também como conseqüência a emancipação econômica do País.
Foi no Centro Acadêmico 11 de Agosto, da Faculdade de Direito de São Paulo, onde estudava que nasceu a idéia de fazermos um concurso nacional de oratória lançando a campanha da defesa do petróleo.
Fomos conversar com o grande brasileiro Monteiro Lobato sobre os nossos propósitos, no seu apartamento, no edifício da Livraria Brasiliense, na Rua Barão de Itapetininga, em São Paulo.
Fomos recebidos por ele com o seu mau humor de sempre, além de estar gripado. Falamos que era imprescindível a conversa e adiantamos o assunto: “Estamos aqui para falar com o senhor sobre um concurso de oratória que iremos fazer. Pretendemos lançar a campanha nacional defendendo o petróleo no Brasil”.
Ele falou: “Vocês são loucos. Não façam! Eu fui perseguido e falaram várias vezes que eu queria explorar petróleo em Lobato, na Bahia. Não façam”. A conversa prosseguiu mais calorosa e ele passou a incentivar a nossa campanha, dizendo que era fundamental desmascarar a Esso e a Shell, como empresas imperialistas e exploradoras do nosso mercado.
Com mais este incentivo de Monteiro Lobato, decidimos fazer o Concurso Nacional de Oratória, que foi um sucesso. Daí partiu a idéia de lançarmos a “Campanha Nacional Do Petróleo É Nosso”.
A “Campanha Nacional Do Petróleo É Nosso” despertou o sentimento nacionalista não só dos estudantes, mas de grande parte da população.
Procuramos fazer uma proveitosa e oportuna aliança com o Clube Militar, que estava lançando a sua campanha de defesa do petróleo e da emancipação econômica do Brasil.
No dia 1º de junho de 1948, foi realizado o Primeiro Comício na Praia do Russel, no Rio de Janeiro, o lançamento da Campanha, em defesa da exploração de nosso petróleo pelo Estado, com a presença dos seguintes oradores:
- Deputado Artur Bernardes - Presidente de Honra do C.E.D.P.;
- Engº Luiz Hildebrando de Horta Barbosa - Presidente do C.E.D.P.;
- Roberto Gusmão - Presidente da UNE
- Senador Matias Olimpio;
- Deputado Gurgel do Amaral;
- Deputado Flores da Cunha
- Vereador Tito Livio de Sant’Anna
- Jornalista Raphael Corrêa de Oliveira
O Comício foi o assunto nacional daquela semana e desencadeou em todos os Estados a “Campanha Nacional Do Petróleo É Nosso”.
Por outro lado, tivemos também adversários poderosos que usaram de todos os meios possíveis para comprometer e acusar a Campanha de um movimento comunista.
As intrigas e as ameaças não nos intimidaram e a Campanha prosseguiu vitoriosa, conquistando o apoio e a confiança do povo e do grupo dos militares nacionalistas.
Deixamos a continuidade desse Movimento para os nossos sucessores na UNE, que a levaram até a conquista final da exploração estatal do nosso petróleo com a criação da Petrobras.
Fizemos na nossa gestão da UNE muitas campanhas de interesse acadêmico e cultural dos estudantes, assim como, a filiação à União Internacional dos Estudantes – UIE, com sede em Praga- Tchecoslováquia, que era na época para nós uma espécie de ONU.
A nossa geração foi sempre comprometida e muito participativa em todos os Movimentos de natureza política, cultural e econômica pelo desenvolvimento do Brasil.
Guardo até hoje as melhores lembranças dos amigos daquela época pelo companheirismo, solidariedade e coragem em todos os embates que travamos na conquista de nossas posições políticas e ideológicas.
Vejo agora esses velhos amigos nas mais altas posições que conquistaram, nos campos da ciência, da medicina, da engenharia, da tecnologia, da advocacia e da economia.
Apesar da absurda limitada e medíocre informação cultural passada pela televisão e a insuportável internet, estou certo de que a mocidade de hoje formada pelas melhores Universidades do Brasil e do Exterior também será capaz de manter e defender os seus sonhos e idealismo de um Brasil cada vez maior e melhor.
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