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domingo, 20 de março de 2011

Depoimento de Roberto Gusmão publicado no livro O PENSAMENTO DAS JUVENTUDES BRASILEIRAS NO SÉCULO XX

Depoimento de  Roberto Gusmão publicado no livro O PENSAMENTO DAS JUVENTUDES BRASILEIRAS NO SÉCULO XX

Dados:

Atividade atual do depoente: Membro do Conselho de Administração da AMBEV e Presidente da Fundação Antônio e Helena Zerrenner (da AMBEV)
Entrevista feita em São Paulo-SP



Eu me chamo Roberto Herbster Gusmão, nasci em Belo Horizonte, no dia 29 de maio de 1923, casado com Ivna Tarsis D’Affonseca Gusmão, advogado — OAB nº 6.559/SP.

Como pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco, Ota­vio Luiz Machado, veio de Recife a São Paulo, armado com um gravador, especialmente para provocar minha memória e minhas lembranças sobre o comportamento de minha geração, diante dos fatos e acontecimentos marcantes daquela época. Partindo da nossa formação política, acadêmica e ideológica, fomos todos influencia­dos e marcados pela absurda e maciça propaganda do comunismo stalinista e do totalitarismo nazista e fascista, como ideologias sal­vadoras do mundo.

Desse modo, fomos vítimas e atores participantes dessas circunstân­cias que colocaram mais dúvidas do que certezas nos nossos sonhos e nos nossos propósitos de jovens universitários.

Fiz parte daquele grupo que não se deixou levar por essas antagôni­cas e radicais ideologias, graças a nossa formação acadêmica e cultural com raízes profundas nos fundamentos da democracia e da justiça social.

A Segunda Guerra Mundial, apesar de suas atrocidades, trouxe tam­bém a derrocada das ditaduras e o fortalecimento em todo o mundo das democracias ocidentais.

Desse modo, foi elaborada e promulgada a Constituição de 1946, dando nova forma ao regime democrático brasileiro com amplas liberdades individuais e a legalidade de todos os partidos políticos com as suas diferentes ideologias.
A União Nacional dos Estudantes — UNE participou ativamente des­se processo de redemocratização do País.

No memorável Congresso de 1947, que teve como presidente de honra o Governador de Minas Gerais, Dr. Milton Campos, fui eleito Presidente da UNE com uma ampla aliança com os representantes dos mais importantes diretórios acadêmicos de todos os Estados do Brasil.

O meu compromisso como Presidente da UNE era defender as li­berdades individuais, particularmente a dos estudantes em sua vida acadêmica, sem nenhuma discriminação de raça, religião ou de ide­ologias.

A “Campanha Do Petróleo É Nosso” surgiu para não somente de­fender a exploração estatal do petróleo, mas também como conse­qüência a emancipação econômica do País.

Foi no Centro Acadêmico 11 de Agosto, da Faculdade de Direito de São Paulo, onde estudava que nasceu a idéia de fazermos um concurso nacional de oratória lançando a campanha da defesa do petróleo.

Fomos conversar com o grande brasileiro Monteiro Lobato sobre os nossos propósitos, no seu apartamento, no edifício da Livraria Bra­siliense, na Rua Barão de Itapetininga, em São Paulo.

Fomos recebidos por ele com o seu mau humor de sempre, além de estar gripado. Falamos que era imprescindível a conversa e adian­tamos o assunto: “Estamos aqui para falar com o senhor sobre um concurso de oratória que iremos fazer. Pretendemos lançar a cam­panha nacional defendendo o petróleo no Brasil”.

Ele falou: “Vocês são loucos. Não façam! Eu fui perseguido e fa­laram várias vezes que eu queria explorar petróleo em Lobato, na Bahia. Não façam”. A conversa prosseguiu mais calorosa e ele passou a incentivar a nossa campanha, dizendo que era fundamental des­mascarar a Esso e a Shell, como empresas imperialistas e explorado­ras do nosso mercado.

Com mais este incentivo de Monteiro Lobato, decidimos fazer o Concurso Nacional de Oratória, que foi um sucesso. Daí partiu a idéia de lançarmos a “Campanha Nacional Do Petróleo É Nosso”.

A “Campanha Nacional Do Petróleo É Nosso” despertou o senti­mento nacionalista não só dos estudantes, mas de grande parte da população.

Procuramos fazer uma proveitosa e oportuna aliança com o Clube Militar, que estava lançando a sua campanha de defesa do petróleo e da emancipação econômica do Brasil.

No dia 1º de junho de 1948, foi realizado o Primeiro Comício na Praia do Russel, no Rio de Janeiro, o lançamento da Campanha, em defesa da exploração de nosso petróleo pelo Estado, com a presença dos seguintes oradores:
- Deputado Artur Bernardes - Presidente de Honra do C.E.D.P.;
- Engº Luiz Hildebrando de Horta Barbosa - Presidente do C.E.D.P.;
- Roberto Gusmão - Presidente da UNE
- Senador Matias Olimpio;
- Deputado Gurgel do Amaral;
- Deputado Flores da Cunha
- Vereador Tito Livio de Sant’Anna
- Jornalista Raphael Corrêa de Oliveira

O Comício foi o assunto nacional daquela semana e desencadeou em todos os Estados a “Campanha Nacional Do Petróleo É Nosso”.
Por outro lado, tivemos também adversários poderosos que usaram de todos os meios possíveis para comprometer e acusar a Campanha de um movimento comunista.

As intrigas e as ameaças não nos intimidaram e a Campanha pros­seguiu vitoriosa, conquistando o apoio e a confiança do povo e do grupo dos militares nacionalistas.

Deixamos a continuidade desse Movimento para os nossos suces­sores na UNE, que a levaram até a conquista final da exploração estatal do nosso petróleo com a criação da Petrobras.

Fizemos na nossa gestão da UNE muitas campanhas de interesse acadêmico e cultural dos estudantes, assim como, a filiação à União Internacional dos Estudantes – UIE, com sede em Praga- Tchecos­lováquia, que era na época para nós uma espécie de ONU.

A nossa geração foi sempre comprometida e muito participativa em todos os Movimentos de natureza política, cultural e econômica pelo desenvolvimento do Brasil.

Guardo até hoje as melhores lembranças dos amigos daquela época pelo companheirismo, solidariedade e coragem em todos os embates que travamos na conquista de nossas posições políticas e ideológicas.

Vejo agora esses velhos amigos nas mais altas posições que con­quistaram, nos campos da ciência, da medicina, da engenharia, da tecnologia, da advocacia e da economia.

Apesar da absurda limitada e medíocre informação cultural passada pela televisão e a insuportável internet, estou certo de que a moci­dade de hoje formada pelas melhores Universidades do Brasil e do Exterior também será capaz de manter e defender os seus sonhos e idealismo de um Brasil cada vez maior e melhor.

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