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segunda-feira, 21 de março de 2011

MEMÓRIAUFPE: Depoimento de Genival Barbosa Guimarães

Depoimento Publicado no livro O PENSAMENTO DAS JUVENTUDES BRASILEIRAS NO SÉCULO XX

A campanha O Petróleo é Nosso  e a emancipação econômica do Brasil
Genival Barbosa Guimarães


 


A minha história universitária começa quando eu vim  estudar Engenharia no Recife, em 1946. Recife é uma cidade que sempre foi destaque. E não há dúvida quanto ao seu papel de capital cultural do Nordeste, inclusive atraindo muitos estudantes de outros Estados da região.


O meu ingresso na Escola de Engenharia de Pernambuco foi muito especial, pois no Nordeste havia apenas as escolas de Engenharia de Recife e Salvador. Por isso que muitos dos meus amigos foram estudar em São Paulo, Ouro Preto ou em outros locais.
 

No mesmo ano do meu ingresso no ensino superior participei do Congresso da UNE no Rio de Janeiro. Naquela ocasião foi eleito José Bonifácio Coutinho Nogueira – que era Presidente do Centro Acadêmico 11 de Agosto em São Paulo –, como Presidente da UNE.

No congresso da UNE do ano seguinte também participamos. Aí eu já conhecia as pessoas dos outros Estados, principalmente do Nordeste. E nós coordenamos a bancada do Nordeste para o apoio conjunto a Roberto Gusmão, que foi então eleito. Foi uma cam­panha um pouco difícil do ponto de vista eleitoral, mas ele ficou muito agradecido aos pernambucanos, sobretudo pela posição ado­tada pela bancada de Pernambuco, que nessa época tinha Armando Monteiro Filho Presidente da União Estadual de Estudantes de Per­nambuco (UEP).

A minha eleição com larga margem de votos para a Presidência da UNE (em 1948) foi possível a dois fatores: a tradição de luta dos estu­dantes em Pernambuco e as nossas participações bem sucedidas nos congressos anteriores da UNE. Havia naquele momento uma inserção dos estudantes na luta pela consolidação da redemocratização do país, assim como uma campanha nacionalista que defendia a campa­nha O Petróleo é Nosso. E eram as nossas principais bandeiras.

Também fui fundador do Centro Pernambucano de Defesa do Pe­tróleo, que era filiado ao Centro Nacional de Defesa do Petróleo Nesse Centro havia o apoio ou a participação de Pelópidas da Sil­veira (que foi Secretário-Geral), Newton Maia (que era o Presidente), Ageu Magalhães (que era o Vice-Presidente), Nelson Chaves, Arnal­do Marques, Antônio Baltar, Paulo Cavalcanti, Amauri Coutinho, Ladislau Porto e muitos outros nomes também respeitados.

A luta pelo monopólio estatal do petróleo estava sendo travada quando assumi a Presidência da UNE. E a campanha do “Petróleo é Nosso” se cristalizou em todo país, porque ela foi feita com muita força, com muito ardor e armada de uma convicção muito forte de que o país só se desenvolveria se tivesse também o desenvolvimento de uma indústria importante, como é a indústria do petróleo.


E não foi só uma campanha de classe universitária estudantil, pois se transformou numa campanha nacional, cuja contribuição foi chamar a atenção para importância para o futuro do país, apon­tando principalmente dos jovens que estavam estudando, que o seu futuro seria diferente com o desdobramento dessa questão que era levantada na época.


Hoje somos praticamente auto-suficientes, que era algo que nem se esperava. Os representantes desses trustes tentaram inviabilizar a cria­ção da Petrobras. Mas ela cresceu como empresa e está no mundo inteiro como participante de prospecção, extração de óleo ou de gás.

Nós estamos muito felizes por ver uma campanha que começou com um descrédito por parte daqueles que tinham interesse que ela não tivesse êxito e porque estavam servindo a interesses de empresas estrangeiras e a capitais estrangeiros vencer. E vemos com a maior satisfação o benefício que trouxe para o país a criação da Petrobrás, que no caso da perfuração a grande profundidade, mantém até hoje a liderança mundial.


Então de fato aquilo que naquela época pensávamos e tínhamos uma idéia de ver algum dia cumprido, agora vemos o resultado daquela obstinação liderada do pelos estudantes, pelos profissionais liberais, militares pelos operários e por tantos outros grupos da sociedade.


A Campanha O Petróleo é Nosso era uma campanha monolítica, pois o nosso pensamento era fechado de tal maneira que ninguém se aventurava a ir lá na praia do Flamengo, 132, no sentido de falar co­migo ou com outro diretor da UNE nessa gestão para mudarmos de posição, pois a questão já estava consolidada. Portanto, não adianta­va qualquer investida para modificar a posição dos estudantes ou da UNE, porque aí já entendiam que era uma posição do povo brasileiro.

Outro momento importante que vivi como Presidente da UNE foi durante a invasão da entidade por policiais. Na ocasião houve um aumento de 50% nas passagens dos bondes, que era a Light que detinha o controle. O governo Dutra e a empresa esperaram exa­tamente o início das férias estudantis em janeiro e o recesso do congresso para anunciarem o aumento na passagem. Mas, os pou­cos estudantes que haviam na cidade se reúnem e resolvem depois ir para um dos pontos mais importantes da cidade, a Praça 11, no largo da carioca. E o faziam aqueles grupos de estudantes? Paravam os ônibus, subiam e faziam o discurso. E falava um ou dois minutos no máximo pra não interromper a viagem e também não chatear os sujeitos que estavam na viagem.


Mas um soldado de polícia que estava em frente a UNE, por onde se passavam os bondes que iam para o Leblon, o Flamengo e outros cantos, chegou e disse para os estudantes: “acaba com essa conversa” e tal. E queria insuflar o povo contra os estudantes, que não acom­panhou porque eram usuários do sistema e estavam feridos no bolso com o aumento. E o soldado partiu pra agressão a um estudante.


E, porque essa coisa que foi defronte da UNE, disso surgiu o tumulto, o soldado disse que foi agredido e chamou reforço. Resultado: cerca­ram o edifício e houve um grande tumulto defronte da sede da UNE, que ficou toda cercada por policiais. Quando eu cheguei quis entrar, mas um soldado disse: “não pode”. Aí eu puxei a carteira e disse: “mas eu sou o presidente da UNE”. Aí ele disse: “um momento”. Chamou o sargento ou capitão que pediu meu documento. O prédio estava totalmente apagado, os estudantes das janelas gritando e criando aquele ambiente.

Quando eu entrei, peguei um grupo e disse: “olha a situação, conversando com eles, a situação é muito séria e quem está sendo atingido agora é a UNE. O nosso edifício está em jogo, eu vou tomar uma série de providências e quero que vocês conversem com o pessoal”. A primeira providência foi acender todas as luzes, abrir todas as janelas e retirar as pessoas que gritavam.

E foi aí que chegaram os choques da polícia especial com sirenes e tudo. Já havia uma maquinação política por detrás da questão.

Após décadas depois da minha participação no movimento estudan­til no debate dos mais diversos temas, creio que é possível afirmar que os estudantes tinham interesse em discutir ao mesmo tempo os assuntos atinentes ao ensino e a tantos outros de interesse do país e da própria juventude, inclusive econômicos e políticos, pois o futuro do Brasil era a nossa grande preocupação e atenção.

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