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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

MATÉRIA: Tempo e adolescência

FONTE: http://www.ondajovem.com.br/tempo-e-adolescencia


07/11/2011
Pesquisa relaciona o tempo livre de adolescentes com sociedade de consumo, bem-estar e felicidade
Divulgado pela editora mundial Springer, especializada em publicações científicas, circula na web a notícia de um estudo americano que mediu a quantidade de tempo livre que adolescentes acreditam ter, associando-a a valores como consumismo, bem-estar e felicidade.
Pesquisadores de duas universidades americanas conduziram o estudo, que envolveu 1,3 mil adolescentes de uma escola pública. Os resultados mostraram que quanto mais consumistas, menos felizes são os jovens, e que a maior ou menor intensidade desse efeito tem relação com o tempo livre do adolescente.
Se o jovem tem muito tempo livre, aumenta o impulso para querer ou consumir mais; se for muito ocupado, com pouco tempo livre, fica insatisfeito e infeliz porque isso o priva de realizar o desejo de consumir. Por isso, concluíram os pesquisadores, “... o tempo equilibrado promove bem-estar não apenas diretamente, mas também no alívio de alguns dos efeitos negativos associados ao estilo de vida da nossa sociedade de consumo”.
Outros tempos
O tempo livre do adolescente também está no filme “Árvore da Vida”, que ganhou a Palma de Ouro em Cannes este ano, mas remetendo a outras relações, muito além do desejo de posse e seus efeitos sobre o bem-estar e a felicidade. É o tempo para absorver conhecimentos específicos e da vida em geral, o tempo para se estruturar como pessoa.
“Árvore da Vida”, do diretor Terrence Malick, apresenta uma reflexão filosófica sobre a existência que dificilmente um adolescente dos anos 2000 aguenta acompanhar – por causa do ritmo, que é de outros tempos.
A reflexão se entremeia na vida de uma família dos anos 50, mostrando o crescimento de crianças, seus conflitos, prazeres, inocências, descobertas e aprendizados de valores. As crianças que viram adolescentes têm tempo para “fazer nada”, pensar, fantasiar, sofrer, ficar só, desafiar, brincar. Têm tempo de experimentar a vida por si próprias, longe dos adultos, e testar com seus pares suas descobertas, emoções, contradições.
Fora e dentro
Quanto mais jovem um indivíduo, mais importante é a forma como ele vive o tempo, diz um especialista em artigo sobre o adolescente e o tempo em revista especializada (Rev. bras. crescimento desenvolv. hum; set.-dez. 2004). É importante porque, como mostra o longa-metragem de Terrence Malick, o tempo é espaço de autoconstrução para o adolescente.
Autoconstrução, na fase de deixar a infância e caminhar para a vida adulta, é um processo que compreende o tempo de entender o que está dentro e fora. O adolescente precisa de tempo livre para ter vivências sobre isso. São elas que o ajudam a se estruturar gradualmente, num movimento de vai e volta, de exposição e recolhimento. Em uma feliz analogia, a psicóloga francesa Françoise Dolto, estudiosa do desenvolvimento humano, compara os adolescentes aos lagostins e lagostas quando perdem sua carapaça: “... nesta época, escondem-se sob os rochedos o tempo suficiente para readquirir as suas defesas.”
A um só tempo
Há mesmo tempos melhores que outros, mas em todos perdas e ganhos. O tempo livre dos adolescentes de hoje certamente é muito mais rico de aprendizados “de fora”, mas talvez falte a muitos o tempo para o “tempo de dentro”. Alvo de preocupações em todo o mundo, as novas gerações, especialmente as de grupos socialmente mais vulneráveis, são impulsionadas a ter ambas as vivências a um só tempo para atenderem à demanda de capital humano das economias.
É nesse contexto que a educação ganha cada vez mais ênfase como passaporte mínimo para a preparação e entrada dos adolescentes e jovens no mercado produtivo, levando governos e organizações a focarem suas atenções em políticas que intensifiquem, entre outros pontos, a conexão entre o mundo da escola e do trabalho.
Ninguém quer ver as novas gerações perdendo tempo. Não há tempo para que elas construam com autonomia sua consciência e visão de vida e de futuro. É preciso colocar os adolescentes e jovens mais tempo na escola, é preciso oferecer a eles capacitação técnica, cultural, socioambiental, emocional. É preciso equipá-los com valores, motivá-los a discutir, provocá-los a sentir e agir, tudo ao mesmo tempo.
Nossa vez
É a visão destes tempos, expressa como desejo, por exemplo, no programa Mais Tempo na Escola, do governo brasileiro:
“Imagine uma escola onde os alunos podem passar até 8 horas por dia, com mais tempo para estudar, mais contato com artes, cultura, esportes e mais tempo com os professores. Esse é o modelo de escola que todos nós, pais, alunos, professores e funcionários queremos. Essa é a escola que já existe em alguns estados brasileiros e em muitos países desenvolvidos. Agora, é a nossa vez.”
São tempos de inclusão, sem dúvida uma maré boa. Mas também de tempo livre focado no desempenho do “capital humano”. Só o futuro mostrará as perdas e ganhos destes tempos.
Texto: Lélia Chacon
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