Caminhos da esquerda latino-americana
Cientista social reverenciado pela esquerda e atacado pela direita, Emir Sader aponta as contradições do capitalismo e diz que a solução para a crise vai em direção contrária à apologia do neoliberalismo
por ENIO RODRIGO B. SILVA fotos LEANDRO FONSECA
Cientista social reverenciado pela esquerda e atacado pela direita, Emir Sader aponta as contradições do capitalismo e diz que a solução para a crise vai em direção contrária à apologia do neoliberalismo
por ENIO RODRIGO B. SILVA fotos LEANDRO FONSECA
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"A atual crise foi profunda, mas não podemos dizer que o capitalismo está ferido de morte" | <><> ><><>>
Com um faro aguçado, embrenhando-se agilmente sem ser notada e surpreendendo os desavisados na superfície ao emergir das profundezas e dos labirintos que cria para viver, a toupeira, animal que em português muitas vezes é associado às pessoas avessas ao exercício cerebral do pensamento é, ao contrário, um animal com destreza única, que trabalha eficientemente e sem alarde em sua função de sobreviver.
"Tal animal remete às incessantes contradições intrínsecas do capitalismo, que não deixam de operar, mesmo quando a 'paz social' - a das baionetas, a dos cemitérios ou a da alienação - parece prevalecer", sentencia Emir Sader, na apresentação de seu novo livro A nova toupeira: os caminhos da esquerda latino-americana, lançado pela Editora Boitempo.
Sader, cientista social que é reverenciado pela esquerda e atacado pela direita, foi professor da Universidade de São Paulo (USP) e, atualmente, dirige o Laboratório de Políticas Públicas (LPP) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além de ser secretário executivo do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso).
Em entrevista durante o lançamento de seu livro, na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP), Sader falou sobre os novos desafios das Ciências Sociais em uma época que é a transição entre o modelo defendido pelo neoliberalismo e um provável novo modelo. "Eu chamo de pós-neoliberalismo, mas ainda não sabemos como será essa nova fase", pontua
Muito foi alardeado, no início da atual crise econômica, sobre o fim do capitalismo como nós conhecemos. Como o senhor vê essa afirmação?
Sader Nenhum sistema econômico acaba com uma crise, ele acaba se ele é superado politicamente. O capitalismo não acabará com uma crise econômica. A crise pode afetar, obrigar que ele se adapte, se transforme, mas isso não é o fim do capitalismo, nem o fim do neoliberalismo, que é um modelo específico do capitalismo. Porque na verdade não aparecem alternativas no horizonte. Todas as reuniões são comandadas por países que estão no centro do capitalismo, que são justamente os responsáveis pela crise. São os países que instalaram o modelo de onde surgiu a crise dessa vez.
Sader Nenhum sistema econômico acaba com uma crise, ele acaba se ele é superado politicamente. O capitalismo não acabará com uma crise econômica. A crise pode afetar, obrigar que ele se adapte, se transforme, mas isso não é o fim do capitalismo, nem o fim do neoliberalismo, que é um modelo específico do capitalismo. Porque na verdade não aparecem alternativas no horizonte. Todas as reuniões são comandadas por países que estão no centro do capitalismo, que são justamente os responsáveis pela crise. São os países que instalaram o modelo de onde surgiu a crise dessa vez.
O G20 tem países do mundo todo que participam, mas quem dá a tônica são os países do norte. Não há hoje, no sul do mundo ou na América Latina, proposta de alternativas ao modelo vigente. Há, na prática, em vários paíse da AL, uma tentativa de superação do modelo, mas globalmente não há essa vontade. Assim eles estão ganhando tempo para a recuperação das potências centrais, e vamos ver que direção toma, porque de uma crise desse tamanho não se sai exatamente tal qual antes. Essa atual crise não é um arranhão, foi profunda, mas não podemos dizer que o capitalismo está ferido de morte
O senhor é grande crítico das políticas neoliberais. Como está o neoliberalismo atualmente? Há opção ao pensamento neoliberal ou as opções são o resgate das políticas anteriores a todo esse movimento?
Sader Bom, claramente a crise econômica atual é uma crise do neoliberalismo. Os neoliberais colocaram o mercado como centro da economia, e é justamente a falta de regulação estatal que, unanimemente, é considerada o diagnóstico da crise. O descontrole quanto a créditos bancários e outros fenômenos ocorridos na esfera econômica, todos os sintomas da crise, apontam que a solução vai em direção contrária à apologia do neoliberalismo. É tão claro, tão nítido, que isso foi causado por esse movimento neoliberal que, de repente, parece que ninguém nunca foi neoliberal.
Sader Bom, claramente a crise econômica atual é uma crise do neoliberalismo. Os neoliberais colocaram o mercado como centro da economia, e é justamente a falta de regulação estatal que, unanimemente, é considerada o diagnóstico da crise. O descontrole quanto a créditos bancários e outros fenômenos ocorridos na esfera econômica, todos os sintomas da crise, apontam que a solução vai em direção contrária à apologia do neoliberalismo. É tão claro, tão nítido, que isso foi causado por esse movimento neoliberal que, de repente, parece que ninguém nunca foi neoliberal.
Todos que alardeavam o neoliberalismo como solução ideal agora parece que se somam à onda da regulamentação. Mas é bom observar que essas regulamentações podem ser ocasionais episódicas, para recompor a capacidade de funcionamento do livre mercado, ou elas podem passar uma fase de combinação entre mecanismo de mercado e regulamentações estatais. É o mais provável que aconteça, mas não sei por quanto tempo. Mas voltando à questão, no horizonte não há modelo alternativo. Então a gente vai passar por um período de instabilidade e turbulência grande, porque é um modelo que esgotou, mas ainda não aparece nem forças sociais, políticas, econômicas propondo um modelo. Portanto, não haverá exatamente a restauração do modelo anterior.
Creio que a chamada globalização, um processo que faz parte do neoliberalismo, impôs transformações das quais não há retrocesso. Não se voltará a economias nacionais. Podem-se fortalecer economias regionais, como já acontece na América do Sul, Europa, coisas assim. As integrações regionais podem se fortalecer, mas não são possíveis regulamentações em nível puramente nacional, da maneira como se estendeu a penetração econômica das corporações internacionais, do capital financeiro. Assim, é difícil que se voltem às regulamentações em nível nacional.
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