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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

OPINIÃO: Um duro golpe nos alunos licenciados em Ciências Sociais?



Por Rogério Proença Leite (Universidade Federal de Sergipe)
Dentro das tratativas entre a CAPES e o CESAD da UFS, um novo curso de especialização foi aprovado e agora tramita no Departamento de Ciências Sociais para aprovação final e inicio do seu funcionamento.

Trata-se do Curso “Especialização em Ensino de Sociologia no Ensino Médio – modalidade à distância” a ser ministrado pelos docentes do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Sergipe.

A proposta do curso é bem interessante e muita oportuna, uma vez que se direciona a oferecer a necessária habilitação para aqueles professores efetivos da rede pública que já lecionam Sociologia, mas não são formados em Ciências Sociais. É uma forma dos usuais professores de matemática, biologia, historia etc serem “efetivados” na disciplina, com uma melhor qualificação curricular.

Tive acesso ao Projeto do curso aprovado e, infelizmente, constatei que de fato o curso poderá ser um duro golpe ao alunos licenciados em Ciências Sociais, esperançosos que sejam abertas vagas especificas nos concursos públicos vindouros. Mais do que isso: instalará uma situação no mínimo inconsistente para o Departamento de Ciências Sociais da UFS. Pois ao mesmo tempo em que estaremos licenciando Cientistas Sociais para exercerem o magistério, estaremos também ofertando formação continuada a quem já é professor concursado em outra área, mas que deseja também lecionar sociologia..... outras palavras, pergunto: não estaríamos ajudando a conformar uma situação hoje indesejada pelo movimento nacional dos estudantes de Ciências Sociais ? qual seja: a luta pelo reconhecimento profissional e a abertura de vagas para Cientistas Sociais no ensino médio??

O curso foi criado na perspectiva de atender à obrigatoriedade do ensino da Sociologia no ensino médio, a partir da lei n° 11.684/2008, de 2 de Junho de 2008, que alterou a LDB, e que consolida uma diretriz já delineada pela o Conselho Nacional de Educação, em seu Parecer CNE/CEB Nº 38/2006, que dispõe sobre a obrigatoriedade das disciplinas Filosofia e Sociologia no currículo do Ensino Médio

Vejamos o que diz o projeto do curso, sobre o público-alvo e quais são os segmentos a serem beneficiados:

“5.4 – Público Alvo:
Professores graduados que estão atuando nos sistemas públicos de
ensino e ministram aulas nos Ensinos Fundamental e Médio.

Obs: Havendo vaga, e em consonância com as necessidades dos respectivos
sistemas de ensino e instituições formadoras, outros segmentos poderão ser
atendidos na oferta deste curso”
(….)

“6.1. Princípios e pressupostos relativos à formação no Curso de Especialização em Ensino de Sociologia no Ensino Médio

“De um lado, o desafio de aprofundar o processo de
formação inicial de professores para essa área por meio de desenhos
curriculares nos cursos de licenciatura em Sociologia que assegurem uma
sólida formação teórica e interdisciplinar, fortemente articulada com as
necessidades da escola e do nosso tempo na contemporaneidade. De outro, o
desafio de responder à formação continuada dos professores que atuam nessa
área, tendo em vista que parcela significativa deles não possui habilitação
específica para o exercício do magistério em Sociologia. É caso de
profissionais graduados em outras áreas e que são do quadro efetivo do
magistério, que por vezes e por diferentes razões, são designados para
ministrar Sociologia no ensino médio” (…..)

O texto parece claro. O curso se volta para a formação continuada de uma número elevado de professores das mais diversas áreas que lecionam Sociologia, ocupando a vaga que deveria ser preenchida por um licenciado em Ciências Socais. Infelizmente, todos sabem porque esses demais profissionais de outras áreas são designados para lecionar Sociologia: primeiro, porque ainda paira um enorme e lamentável preconceito que matérias como Sociologia, Artes e Filosofia podem ser ministradas por qualquer um. Segundo, para complementação de carga horária. Muitos desses profissionais sequer são das áreas de Humanas, o que piora ainda mais o quadro. Isso tem reconhecidamente trazido grandes prejuízos aos profissionais formado em Ciências Sociais. Se a tendência for essa, muitos profissionais de Ciências Sociais continuarão sem a chance de concorrer a uma vaga em concurso público porque simplesmente vagas não serão abertas. E não serão abertas porque aparentemente não há necessidades, uma vez que o acúmulo de disciplinas por professores de áreas diferentes está mascarando a verdadeira carência de profissionais qualificados nas áreas específicas.

O meu nome está na proposta original e já solicitei que fosse retirado por discordar pedagógica e politicamente dos objetivos do curso. Para mim é vital que o curso não corrobore uma prática pedagógica duvidosa que tem trazido enormes dissabores a quem passa anos estudando Ciências Sociais e depois descobre que nem para lecionar Sociologia ele é necessário, simplesmente porque outros profissionais estão ocupando a vaga que deveria ser sua.

Tenho tudo respeito e sou reconhecedor da enorme importância social que os cursos à distância da UAB têm tido no Brasil, favorecido uma inclusão educativa. Contudo, creio que a expansão de vagas não pode por em risco a qualidade do ensino e a coerência das nossas propostas de ensino.

Penso ser válido qualquer curso, desde que ele não entre em rota de colisão com outros já existentes. Por isso indago e faço dessa pequena reflexão um convite ao debate:
Aqui no Estado de Sergipe (e, imagino, em outros estados do país) , muitos dos ex-alunos, licenciados em Ciências Sociais, aguardam com ansiedade a abertura de concurso publico, na esperança que as vagas sejam destinadas restritamente para aqueles que forem portadores da licenciatura em Ciências Sociais. Nada mais justo, penso eu. E devemos não apenas apoiar essa reivindicação, como também somar esforços possíveis para que ela se amplie.

Pois bem, eis a questão que considero mais importante: em que medida é valida a existência de um curso de especialização que contraria os interesses dos licenciados em Ciências Sociais, ao permitir que outros profissionais já concursados se habilitem legalmente para a lecionar Sociologia, tornando desnecessária a abertura de novos vagas para Ciências Sociais em concursos vindouros ?
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