FONTE: http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=78639
Artigo do professor Alfredo Pereira Jr. enviado ao JCEmail.
Frente ao indeferimento, em 29/07/2011, de minha solicitação de progressão para Professor Adjunto III, pela Congregação do Instituto de Biociências da Unesp - Campus de Botucatu, gostaria de divulgar para a comunidade científica brasileira o que me parece ser uma concepção equivocada a respeito da bolsa de produtividade, e da própria atividade de pesquisa científica.
O indeferimento se deveu a uma única exigência que não teria sido satisfeita: "ter coordenado ao menos dois projetos de pesquisa com financiamento externo à Unesp". Entretanto, eu comprovei ter coordenado três projetos, financiados pelo CNPq com Bolsa de Produtividade em Pesquisa. A Congregação, em votação apertada (14 a 12), decidiu pela interpretação de que a Bolsa de Produtividade não constitui financiamento de pesquisa. Venho aqui apresentar meus argumentos contrários a esta interpretação, que separa o pesquisador da pesquisa realizada, consistindo assim em um resquício do Positivismo do Séc. XIX.
A Bolsa de Produtividade não financia materiais, equipamentos ou infra-estrutura de pesquisa, porém financia o componente mais importante da pesquisa inovadora, que é o trabalho intelectual do coordenador do projeto. Decerto ela também não financia o trabalho dos demais participantes da pesquisa, como estagiários, alunos de pós-graduação ou técnicos de laboratório. Em certos tipos de pesquisa, é necessário realizar captação de recursos para cobrir todas estas frentes de trabalho, mas em outros casos (como na área de Filosofia, ou em pesquisas teóricas em Psicologia, como é o meu caso), não há a necessidade de captação destes auxílios, pois o trabalho intelectual é o principal fator envolvido na geração dos resultados. Portanto, é injusto exigir que um pesquisador, para que possa progredir em sua carreira acadêmica, tenha feito tal captação de auxílios, uma vez que suas pesquisas não demandaram outros recursos senão seu trabalho intelectual.
Pode-se argumentar que, para o docente da Unesp em RDIDP, este trabalho já é financiado pelo salário. Entretanto, as exigências para o bolsista de produtividade são muito maiores que as da Unesp, no que se refere à quantidade e qualidade de publicações. Para a manutenção da Bolsa de Produtividade, na área de Psicologia, é necessário produzir em média dez publicações anuais, contando-se mais pontos para publicações de maior índice de impacto, entre outras exigências.
Além da importância da Bolsa de Produtividade para a carreira do pesquisador, o incentivando a gerar resultados e publicações muito acima do mínimo exigido pela universidade, há outro argumento, que me parece ser decisivo para a caracterização da Bolsa de Produtividade como financiamento da pesquisa. O argumento é que o próprio CNPq entende que a execução do Projeto de Pesquisa, proposto pelo bolsista e aprovado pela agência, é obrigatória, e que no caso de não cumprimento do Projeto os valores recebidos devem ser devolvidos. Se a bolsa fosse apenas um prêmio para o pesquisador (o que não deixa de ser), a exigência de execução do Projeto não se colocaria.
No regulamento da Bolsa de Produtividade, que consta no site do CNPq, está estabelecido, dentre as obrigações do pesquisador (Item 1.10.1): "É obrigação do bolsista, durante a vigência da bolsa, dedicar-se às atividades de pesquisa previstas no projeto apresentado ao CNPq". Ora, se o bolsista é obrigado a executar o Projeto, não se pode desvincular o recebimento da Bolsa do trabalho intelectual realizado, caracterizando-se, portanto, a Bolsa de Produtividade como financiamento de Projeto de Pesquisa.
Agindo deste modo, sinalizado pela decisão da Congregação do Instituto de Biociências da Unesp - Botucatu, a universidade, ao invés de valorizar o trabalho intelectual de pesquisa de seus docentes, simplesmente se nega a reconhecer este trabalho, considerando como relevante apenas a captação de recursos materiais para a pesquisa. Assim, coloca-se na contramão das práticas de financiamento de pesquisa vigentes nos países que fazem investimentos de peso em Ciência e Tecnologia, os quais concedem "Grants" para o trabalho intelectual dos pesquisadores, ao lado do financiamento para aquisição de bens materiais necessários para a pesquisa.
Sem entrar em maiores considerações, lembro apenas que o papel central da Ciência e Tecnologia na sociedade atual levou os economistas a considerarem a existência de "bens intangíveis", que incluem o conhecimento e a capacidade de resolução de problemas que afligem os países e instituições. Neste contexto, seria de se esperar que a Unesp reconhecesse e valorizasse os "bens intangíveis" de que dispõe.
Alfredo Pereira Jr é professor do Departamento de Educação do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp). E-Mail: apj@ibb.unesp.br.
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